O consumo de cannabis e a procura de tratamento devido a esta dependência têm aumentado a nível europeu. A Madeira segue também a tendência. Nélson Carvalho diz que esta é a droga ilícita que tem levado mais pessoas a internamentos.

A nível europeu e nacional, tem aumentado o consumo de cannabis e a procura por tratamento devido a esta dependência, sendo que a Madeira segue também essa tendência. «Neste momento - se não é, para lá caminha -, a cannabis é a primeira droga ilícita como motivo de procura de tratamento. Já ultrapassou a heroína a nível nacional e europeu e começa a ter essa tendência a nível regional», alertou Nelson Carvalho, responsável pela Unidade Operacional de Intervenção em Comportamentos Ilícitos (UCAD), na tutela do IASAÚDE, da Secretaria Regional da Saúde, em declarações ao JM.  Sem poder apresentar números que comprovam esta tendência, o especialista admitiu que essa tem sido uma preocupação da UCAD e dos serviços que lidam com as toxicodependências.

Nelson Carvalho falava ao JM a propósito de uma análise aos dados revelados na última terça-feira pelo Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência.

Esse documento revela que mais de 25% da população da União Europeia com idades entre os 15 e os 64 anos já experimentaram drogas ilícitas durante a sua vida, com a ‘cannabis’ a ser a droga mais experimentada, seguida da cocaína.

De toda a população adulta (entre os 15 e os 64 anos), que no último ano admitiu o consumo de drogas, 23,5 milhões de pessoas tinham consumido ‘cannabis’, 3,5 milhões cocaína, 2,7 milhões ‘ectsasy’, 1,8 milhões anfetaminas e 1,3 milhões consumiram opiáceos.

Com efeito, Nelson Carvalho destacou como aspeto preocupante o aumento do consumo de cannabis, «droga ilícita que tem registado um aumento ao nível da sua pureza e concentração» e, por conseguinte, também na dependência, o que tem levado mais pessoas a internamentos para saírem do vício.

Nelson Carvalho comentou que «ainda há muita gente que banaliza a “cannabis”, que pensa que é uma droga inócua, inofensiva, leve». No entanto, «é importante perceber que é uma droga perigosíssima, que pode pôr em risco a nossa saúde a vários níveis». Tanto que, está estimado que 20 a 25 por cento das doenças mentais do mundo se devem à cannabis.

O responsável mostrou-se ainda preocupado com o facto de o relatório do Observatório Europeu divulgar que a “cannabis” está a ter maior índice de pureza e concentração de THC, o principal pincípio ativo, e com uma menor concentração de canabidiol, outro ativo que tem um efeito «protetor» da substância para a saúde. «Ao estar mais potente e com maior concentração, torna-se ainda mais perigosa para a saúde mental e para as dependências».

Por outro lado, o consumo de substâncias psico-ativas também tem vindo a aumentar a nível europeu. Segundo o Observatório, os dados disponíveis sugerem ainda um aumento de produção das novas substâncias psicoativas em laboratórios clandestinos na Europa. Em Portugal existe, há quatro anos, legislação que proíbe estas novas substâncias, o que teve como consequência o encerramento das lojas conhecidas como ‘smartshops’. Partiu da Madeira a legislação nesse sentido, recordese, tendo voltado a tomar medidas legislativas nesta área recentemente. «Isso demonstra que a Madeira tem estado na linha da frente nesta matéria, tem investido na prevenção, no tratamento, quer na monitorização do fenómeno, que os dados que nos têm chegado é que o fenómeno está estável, o que para nós é muito importante», realçou o responsável pela UCAD.

Entretanto, e numa altura em que a nível nacional surgiram notícias de que foram registados em Portugal 41 casos de consumo de flakka, uma droga sintética conhecida por “droga zombie” - e que tem como um dos principais efeitos secundários a condução a comportamentos paranoicos, incluindo, em casos extremos o canibalismo -, é de referir que já houve suspeitas do consumo desta substância também na Madeira. Mas, no geral, o consumo de substâncias sintéticas tem estado estável na Madeira. «Ao contrário do panorama nacional e europeu, aqui não se nota um aumento, mas sim uma estabilização do fenómeno», garantiu Nelson Carvalho.

De qualquer modo, nunca é demais alertar e sensibilizar para que as pessoas se mantenham longe deste tipo de substâncias psico-ativas. «É importante que não se arrisque. São substâncias extremamente perigosas, que são trabalhadas em laboratório, com efeitos muito potentes e nefastos para a saúde. E que podem pôr em risco a saúde do indivíduo». Nelson Carvalho destacou ainda o trabalho desenvolvido na região no combate e prevenção, focando o «esforço feito pelo Governo Regional, através da Secretaria Regional da Saúde, em articulação com outros parceiros, como a Casa São João de Deus, entidades judiciais e policiais. «Tem havido um trabalho inter-setorial muito importante e tem havido investimento. Dessa forma, procuramos monitorizar e minorar este fenómeno».

Quanto aos dados europeus do Observatório, o cenário traçado é preocupante. Mais de 93 milhões de pessoas na União Europeia já tinham experimentado drogas ilícitas, sendo a iniciativa mais frequente nos homens do que nas mulheres. Os valores do último ano revelam que o consumo atinge principalmente a população adulta jovem, estimando-se que, só entre os 15 e os 34 anos, tenham consumido drogas 18,7 milhões de pessoas nos últimos 12 meses.

De referir ainda que cerca de 80 mil apreensões de novas substâncias psicoativas foram notificadas na União Europeia em 2015, o que significa que o número mais do que duplicou em três anos.

Na globalidade, as novas drogas ou substâncias psicoativas continuam a ser vistas como «um desafio considerável para a saúde pública», apesar de estarem a surgir novas substâncias a um ritmo mais lento do que nos anos anteriores.

Em 2016, foram detetadas 66 novas substâncias psicoativas na União Europeia, quando em 2015 tinham sido identificadas 98. Ao todo, 620 substâncias eram monitorizadas pelo Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência.

Quanto às apreensões, foi efetuado um número recorde em 2015 de cerca de 80 mil apreensões destas novas drogas, quando em 2012 esse número ia pouco além das 30 mil apreensões.

Número está estável; em 2012 eram 206

50 reincidentes nas psico-ativas

O pico mais alto do consumo destas substâncias foi em 2012.

As drogas psico-ativas levaram, no ano passado, 50 pessoas, a internamentos na Casa de Saúde São João de Deus, no Trapiche. O JM sabe que se tratam de indivíduos recorrentes naquela unidade, ou seja, que dão entrada para tratamentos, mas que acabam por voltar a consumir e, como tal, a regressar, numa espécie de “porta giratória”. Foi-nos dito que este tipo de substâncias químicas, como o “bloom” e o “flakka”, não têm atraído novos consumidores.

Recorde-se ainda que, aquando o “boom” do consumo de drogas psico-ativas na Madeira, em 2012, em que foi criada legislação para encerrar as smartshops e prevenir o uso destas substâncias, a Casa de Saúde chegou a ter 206 internamentos.

No número atual, um dado que nos foi realçado tem a ver com a idade dos consumidores, já que não existem menores. Os atuais consumidores têm uma idade média entre os 32 e 33 anos.

«Desde que a lei foi publicada, não deu entrada nenhum menor, por causa destas drogas», disseram-nos lembrando ainda que o número de entradas nas urgências por causa das drogas psico-ativas também diminuíam significativamente.

Em Portugal morreram 40 pessoas em 2015

Mortes por overdose aumentaram na Europa

Mais de 700 pessoas por mês morreram por ‘overdose’ na Europa em 2015, número que tem crescido nos últimos três anos, alertou o Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência, destacando a “preocupação com o número crescente de mortes por overdose pelo terceiro ano consecutivo” e refere estimar-se que, em 2015, tenham morrido 8.440 pessoas dessa forma nos países da União Europeia, na Noruega e na Turquia.

Em Portugal registaram-se 40 mortes por ‘overdose’ em 2015, o segundo ano em que se deu um aumento consecutivo deste tipo de mortalidade, segundo dados de um relatório nacional já apresentado em fevereiro deste ano.

NÚMEROS da EU

93 MILHÕES DE PESSOAS DA UE JÁ EXPERIMENTARAM DROGAS

18,7 MILHÕES SÃO JOVENS ENTRE OS 15 E OS 34 ANOS

8.440 PESSOAS MORRERAM DE OVERDOSE EM 2015

620 SUBSTÂNCIAS MONITORIZADAS PELO OBSERVATÓRIO

In “Jornal da Madeira”