Depois de um decréscimo entre 2015 e 2016, no ano passado voltou a aumentar o total de nascimentos na Região, registando-se o melhor número dos últimos cinco anos

 

A natalidade na Região registou, em 2017, o melhor resultado dos últimos 5 anos.

A contabilização feita pelo DIÁRIO com base no total de crianças nascidas no ano transacto no Serviço de Obstetrícia do Hospital Dr. Nélio Mendonça, na Clínica da Sé e na Clínica de Santa Catarina, dá conta de que houve 1.956 nados-vivos em 2017.

Isto revela que, depois de uma quebra de 4,5% entre 2015 e 2016 (respectivamente 1.947 e 1.858 nados vivos), o número de nascimentos voltou a aumentar na Região em cerca de 5% entre 2016 e 2017.

Aliás, o total registado no ano passado é mesmo o melhor desde 2012, último ano em que o total de nados-vivos na Madeira e Porto Santo atingiu um valor superior a 2 mil nascimentos (2.047). Desde então, o melhor ano tinha sido 2015, com 1.947 nados-vivos, um valor mesmo assim inferior ao registado no ano passado.

Maioria opta pelo Hospital Dr. Nélio Mendonça

Dos 1.956 nascimentos contabilizados em 2017, 97% (1.892) ocorreram no Serviço de Obstetrícia do Hospital Dr. Nélio Mendonça (em 2016 foram 1.772). Na Clínica de Santa Catarina registaram-se 53 nascimentos e na Clínica da Sé foram apenas 11.

Os dados fornecidos ao DIÁRIO pelo Serviço de Saúde da Região (SESARAM) indicam ainda que o mês de Dezembro foi aquele em que, no Hospital, se registou maior número de partos em 2017 (185), seguido de perto de Outubro (184) e o mês de Abril aquele que houve menos nascimentos (127).

Quanto ao sexo dos bebés, no ano transacto nasceram no Hospital Dr. Nélio Mendonça mais rapazes (968) do que raparigas (924). Na Clínica da Sé foram 6 raparigas e 5 rapazes.

Refira-se ainda que no Serviço de Obstetrícia do Hospital Dr. Nélio Mendonça entre os vários partos realizados em 2017, registaram-se 24 partos gemelares.

Metade dos nascimentos em três décadas

Se a análise à natalidade for feita num espaço temporal mais alargado, é fácil perceber como a realidade das famílias da Região mudou nas últimas décadas. Por exemplo, e de acordo com dados disponíveis no portal da Direcção Regional de Estatística, em 1987 nasceram na Madeira 3.820 bebés, ou seja, praticamente o dobro (mais 49%) do total de nados-vivos em 2017.

Dez anos depois, em 1997, o total de nascimentos foi de 3.119, mais 37% do que no ano que agora findou. Já em 2007, ainda nasciam quase 3 mil bebés na Região: os dados da Direcção Regional de Estatística falam em 2.718 nados-vivos, ou seja mais 28% do total de 2017.

Ou seja, nas últimas três décadas a tendência, embora com algumas oscilações, tem sido sobretudo decrescente, sendo que, até 1985, registavam-se mais de 4 mil nascimentos por ano. Depois, entre 1986 e 2003, oscilou entre 3.948 e 3.181 nados-vivos, baixando, no ano seguinte, para o patamar dos dois milhares, onde se manteve até 2012 (2.047 nascimentos).

Desde então, essa marca ainda não conseguiu ser atingida, sendo que em 2014, nem chegou a atingir a margem dos 1.800 nascimentos, o que corresponde a uma média mensal aproximada de 144 nados-vivos. No ano passado, a média mensal foi de 163 nascimentos.

Ainda não é possível saber se, com este ligeiro aumento, a Região vai inverter o ciclo negativo que tem sido notório nos últimos tempos em termos de índice e taxa de fecundidade.

Em 2016, de acordo com dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), a Madeira apresentou o índice sintético de fecundidade mais baixo do país: 1,07 nados-vivos por mulher em idade fértil. Aliás, neste âmbito a Madeira está mesmo em contra-ciclo com o resto do país onde se tem registado um aumento, mesmo que ligeiro, do índice de fecundidade.

Também no que concerne a taxa de fecundidade geral, a Madeira volta a estar no lugar mais baixo da tabela: 29,2 nados-vivos por mil mulheres em idade fértil.

Diminuição da natalidade com efeitos directos e indirectos

Maria Filomena Mendes, presidente da Associação Portuguesa de Demografia e professora do Departamento de Sociologia da Universidade de Évora, refere ao DIÁRIO que a crise económica e o adiamento da maternidade contribuíram de sobremaneira para o decréscimo na natalidade.

“A crise económica que implicou uma redução de rendimentos das famílias, um aumento do desemprego (sobretudo do desemprego jovem), um aumento da precariedade das relações laborais, mas que motivou também um aumento da emigração, provocou uma agudização do declínio da natalidade”, explica.

“Também a alteração de determinados comportamentos e atitudes, por exemplo, em relação ao casamento e da idade considerada ‘adequada’ ou mesmo ‘ideal’ para ter filhos, com reflexo no adiamento da maternidade que tem, por sua vez, como consequência não apenas um aumento das possibilidades das pessoas decidirem não ter filhos como também, em muitos casos, ter apenas um filho único”, acrescenta a socióloga.

E esta diminuição da natalidade tem um efeito directo de diminuição do efectivo populacional, efeito ainda mais visível se o número de óbitos aumentar e for superior ao número de nascimentos que ocorrem ano após ano; e, ainda, se conjugado com uma situação em que o número de imigrantes que a Região atrair não compensar o número de emigrantes. “No primeiro caso, a manutenção ao longo de vários anos de um saldo natural negativo, não compensado por um saldo migratório positivo e de valor superior, implica um declínio populacional no médio e no longo prazo”, acrescenta. E há também um efeito indirecto e igualmente de enorme importância em termos sociais, que tem de ser tido em conta: o agravamento do envelhecimento populacional, motivado pelo aumento da proporção de idosos na população devido à redução do número de jovens.

Maria Filomena Mendes sublinha assim que o efeito da baixíssima fecundidade registada a partir de 2012 na Região reflectir-se-á na evolução da população, “à medida que estas gerações de menor dimensão forem avançando no seu curso de vida e, também, quando atingirem a idade de casar e ter filhos, o número de nascimentos a que poderão dar origem tenderá a ser menor, mesmo se as mulheres destas gerações vierem a registar uma fecundidade superior à das suas mães”, alerta.

Daí a importância de serem implementadas medidas que podem criar um ambiente favorável à decisão de ter ou não um filho (ou mais um filho) nos casos em que as pessoas desejam e tencionam ter filhos. A presidente da Sociedade Portuguesa de Demografia exemplifica com “o aumento dos rendimentos das famílias, crescimento do emprego e diminuição do desemprego, diminuição da precariedade”, entre outras medidas e factores (caso dos custos associados à educação e saúde dos filhos em todas as idades) que favorecem a redução da incerteza e da insegurança em que vivem muitas famílias. “Para a decisão de ter ou não (mais) filhos as expectativas em relação ao futuro são determinantes, não apenas em termos individuais e familiares, mas também em termos colectivos, isto é, a perspectiva de evolução económica do país, do desemprego, do acesso à saúde”.

Maria Filomena Mendes acrescenta ainda a importância da conciliação entre trabalho e família, “não apenas no caso da mãe (importantíssimo garantir condições às mães que trabalham) mas também ao pai (particularmente importante quando se trata de decidir ter um segundo filho), associada a todas as medidas de facilitação de afectação do tempo entre trabalho e família, como por exemplo, a licença de parentalidade e a sua extensão também no caso do pai, tal como a atribuição de subsídios e abonos de família com efeito no rendimento disponível das famílias. Para além da existência de medidas de política, a sua manutenção ao longo do tempo, de modo a salvaguardar as expectativas das famílias relativamente à duração e sua continuidade, é fundamental”, conclui.

 

In “Diário de Notícias”