Passar horas a jogar, com ou sem dinheiro e em prejuízo de todas as outras dimensões da vida, vai passar a ser considerado um distúrbio psiquiátrico.

O vício dos videojogos vai passar a ser classificado como doença pela Organização Mundial da Saúde (OMS). A nova edição do manual da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde daquela agência da Organização das Nações Unidas que é lançada este ano traz a confirmação de que passar horas isolado da família e dos amigos, com problemas de sono, uma alimentação inadequada e com degradação do rendimento escolar ou laboral, é uma questão do foro da saúde mental que requer diagnóstico e tratamento adequados.

 

A OMS passou dez anos a monitorizar os transtornos associados ao vício do jogo e, na versão provisória da nova edição do manual, caracteriza esta doença em dois capítulos distintos, consoante se trate de gaming ou gambling disorder. A diferença é que o segundo envolve geralmente dinheiro, mas em ambos os casos os especialistas da OMS falam de um padrão “persistente ou recorrente”, no qual o jogador não consegue controlar o início, a frequência, a intensidade, a duração e o contexto” em que joga, dando ao jogo prioridade sobre outras actividades e dimensões da vida, independentemente da escalada de consequências negativas que aquele possa começar a assumir.

 

Para o diagnóstico é necessário que este padrão de comportamento se prolongue por menos 12 meses, embora a duração requerida para o diagnóstico “possa ser encurtada se todos os outros requisitos de diagnóstico forem atendidos e os sintomas graves”.

 

Para o psicólogo Pedro Hubert, especializado no tratamento deste tipo de dependência, a classificação de tal dependência na lista de doenças “é a comprovação científica de que [o vício do jogo] é um problema que pode ser muito grave”. Uma das vantagens é que tal inclusão “organiza os critérios de diagnóstico em qualquer sítio do mundo, permitindo que um sul-coreano fale com um norte-americano ou um português” com base nos mesmos pressupostos.

 

Numa altura em que o avanço das tecnologias transportou a dependência literalmente para o bolso das pessoas, com o acesso ao jogo a ser possível a partir de um simples telefone, “esta confirmação de que é uma perturbação verdadeira grave e não apenas um exagero dos media ou dos pais que não conseguem lidar com os filhos” é importante, na opinião de Hubert, que saúda ainda a universalização dos modelos de tratamento daí decorrentes”.

 

Natália Faria

 

 

 

In “Público”